- Oxfam condena “tomada do setor privado” nos esforços de desenvolvimento, enquanto mais de 3,7 bilhões de pessoas permanecem na pobreza dez anos após a aprovação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
- Nova análise da Oxfam revela “aumento astronômico da riqueza privada”: entre 1995 e 2023, a riqueza privada global cresceu US$ 342 trilhões – 8 vezes mais que a riqueza pública.
- Governos estão fazendo os maiores cortes em ajuda humanitária desde o início dos registros, o que pode levar a 2,9 milhões de mortes adicionais por HIV/AIDS até 2030.
- Pesquisa global mostra que 9 em cada 10 pessoas apoiam financiar serviços públicos e ações climáticas com impostos sobre os super-ricos.
- Oxfam pede novas alianças estratégicas para combater a desigualdade, revitalizar a ajuda humanitária, taxar os super-ricos e priorizar o setor público sobre o privado.
A riqueza dos 1% mais ricos do mundo aumentou mais de US$ 33,9 trilhões (em termos reais) desde 2015, segundo nova análise da Oxfam divulgada antes da maior conferência sobre financiamento para o desenvolvimento da última década, em Sevilha, Espanha. Esse valor seria suficiente para eliminar a pobreza global anual 22 vezes, considerando o limite máximo de US$ 8,30 por dia do Banco Mundial. A fortuna de apenas 3.000 bilionários cresceu US$ 6,5 trilhões no mesmo período e agora equivale a 14,6% do PIB global.
O relatório “Do Lucro Privado ao Poder Público: Financiando o Desenvolvimento, Não a Oligarquia” será lançado antes da 4ª Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento (30 de junho), organizada pela Espanha com participação de mais de 190 países.
Países ricos estão realizando os maiores cortes em ajuda humanitária desde 1960. Os países do G7, responsáveis por 75% da ajuda oficial, reduzirão seus repasses em 28% até 2026. Enquanto isso, a crise da dívida está levando governos à falência: 60% dos países de baixa renda estão à beira do colapso, gastando mais com credores do que com saúde e educação. Apenas 16% das metas dos ODS estão no rumo certo para 2030.
A Oxfam critica a estratégia de priorizar investidores privados, que beneficiou os mais ricos (os 1% detêm 43% dos ativos globais), mas falhou em mobilizar recursos suficientes para o desenvolvimento. Credores privados, que hoje representam metade da dívida dos países pobres, agravam a crise com termos abusivos e recusa em renegociar.
“Sevilha é o primeiro grande encontro global em um momento em que a ajuda humanitária está sendo destruída, uma guerra comercial começou e o multilateralismo está em frangalhos – tudo sob o pano de fundo do segundo governo Trump. O desenvolvimento global está falhando porque os interesses de uma minoria super-rica são colocados acima de todos os outros”, disse Amitabh Behar, diretor-executivo da Oxfam Internacional.
O que o Banco Mundial descreveu como uma mudança de paradigma de “bilhões para trilhões” tem sido uma bênção para investidores ricos – os 1% mais ricos possuem 43% dos ativos globais – mas agora enfrenta evidências esmagadoras de fracasso, mesmo segundo seus antigos defensores. De modo alarmante, há um novo impulso por trás da ideia de desviar o pouco de ajuda que resta para atores financeiros privados.
“Os países ricos colocaram Wall Street no comando do desenvolvimento global. É uma tomada do poder pelo setor financeiro privado, que suplantou as formas comprovadas de combater a pobreza por meio de investimentos públicos e tributação justa. Não é surpresa que os governos estejam desastrosamente fora do rumo, seja na promoção de empregos dignos, igualdade de gênero ou fim da fome. Essa concentração de riqueza está sufocando os esforços para acabar com a pobreza”, afirmou Behar.
Nova análise da Oxfam mostra que, entre 1995 e 2023, a riqueza privada global cresceu US$ 342 trilhões – 8 vezes mais que a riqueza pública global, que aumentou apenas US$ 44 trilhões. A riqueza pública global – como parcela da riqueza total – na verdade diminuiu entre 1995 e 2023.
Viviana Santiago, Diretora Executiva da Oxfam Brasil, afirmou: “O Brasil é um retrato escancarado do fracasso do atual modelo de desenvolvimento global, que prioriza lucros privados em vez do bem-estar coletivo. A extrema concentração de riqueza no topo, alimentada por um sistema tributário injusto e regressivo, aprofunda desigualdades históricas de raça e gênero. São as mulheres negras, indígenas e periféricas que pagam o preço mais alto da crise climática, da fome e do desmonte dos serviços públicos. Precisamos urgentemente de um pacto global baseado em justiça tributária, fortalecimento do setor público e reparação histórica. Os trilhões acumulados pelos super-ricos, inclusive no Brasil, não podem mais ser blindados. A população já sinalizou que 9 em cada 10 brasileiras e brasileiros apoiam taxar fortemente os mais ricos para financiar saúde, educação e ação climática”.
A Oxfam aconselha os governos a se unirem em torno de propostas políticas que ofereçam uma mudança de rumo, combatendo a desigualdade extrema e transformando o sistema de financiamento do desenvolvimento:
- Novas alianças estratégicas contra a desigualdade: Os governos devem se unir em novas coalizões para se opor à desigualdade extrema. Países como Brasil, África do Sul e Espanha estão oferecendo liderança para isso internacionalmente. Uma nova “Aliança Global Contra a Desigualdade”, apoiada por Alemanha, Noruega, Serra Leoa e outros, serve de exemplo para que outras nações apoiem.
- Abordagem “público primeiro” – rejeitar o Consenso de Wall Street: Os governos devem rejeitar o financiamento privado como a solução mágica para o desenvolvimento. Em vez disso, devem investir em desenvolvimento liderado pelo Estado – para garantir serviços universais de saúde, educação e assistência de alta qualidade – e explorar bens públicos em setores como energia e transporte.
- Repensar totalmente o financiamento do desenvolvimento: taxar os super-ricos, revitalizar a ajuda humanitária, reformar a arquitetura da dívida e ir além dos indicadores de PIB. Os doadores do Norte Global devem reverter urgentemente os cortes catastróficos à ajuda vital e cumprir a meta de 0,7% de AOD (Ajuda Oficial ao Desenvolvimento) como mínimo. Os governos devem apoiar uma nova convenção da ONU sobre dívida e a convenção tributária da ONU, aproveitando o esforço do G20 liderado pelo Brasil para tributar indivíduos com alto patrimônio.
“Trilhões de dólares existem para cumprir as metas globais, mas estão trancados em contas privadas dos super-ricos. É hora de rejeitarmos o Consenso de Wall Street e colocarmos o setor público no comando. Os governos devem atender aos amplos apelos para taxar os ricos – e combinar isso com uma visão para construir bens públicos, da saúde à energia. É um sinal esperançoso que alguns governos estejam se unindo para combater a desigualdade – mais países devem seguir seu exemplo, começando em Sevilha”, disse Behar.
O relatório “Do Lucro Privado ao Poder Público” está disponível aqui.
Notas para a imprensa
- A análise dos cortes na ajuda humanitária e seu impacto está aqui.
- Pesquisa sobre taxação dos super-ricos foi realizada em 13 países (incluindo Brasil) – veja os resultados aqui.
- O estudo que pesquisou a opinião global sobre a taxação dos super-ricos foi encomendado pela Greenpeace e Oxfam Internacional. A pesquisa foi realizada pela empresa de análise de mercado Dynata entre maio e junho de 2025, no Brasil, Canadá, França, Alemanha, Quênia, Itália, Índia, México, Filipinas, África do Sul, Espanha, Reino Unido e EUA. Juntos, esses países representam quase metade da população mundial. Veja os resultados.
- O custo de acabar com a pobreza é baseado no custo anual para erradicar a pobreza em 2024 por um ano, para os mais de 3,7 bilhões de pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza de US$ 8,30 por dia, de acordo com dados do Banco Mundial. O aumento na riqueza do 1% desde 2015 seria mais do que suficiente para cobrir esse custo 22 vezes. Outra forma de expressar isso é que o valor total seria suficiente para acabar completamente com a pobreza por 22 anos. Isso é apenas indicativo, pois o custo para acabar com a pobreza provavelmente cairia nos próximos 22 anos à medida que o número de pessoas na pobreza diminuísse, e o valor da riqueza aumentaria já que não seria gasto de uma só vez. No entanto, essa comparação indica até que ponto mais riqueza, que está sendo altamente concentrada nas mãos de poucos, poderia ser direcionada para acabar com a pobreza, em vez de inflar ainda mais as fortunas dos mais ricos. Para mais informações sobre os cálculos, consulte o documento informativo.
- A Oxfam realizará um grande evento de alto nível em conjunto com o Club de Madrid, às 19h do dia 1º de julho de 2025, em Sevilha, com a participação de altos representantes governamentais para discutir o documento informativo. Jornalistas estão convidados a participar e terão prioridade para perguntas. Inscreva-se aqui.
- Além disso, um evento paralelo oficial sobre desigualdade e reforma tributária ocorrerá às 14h30 do dia 1º de julho de 2025, no Centro de Exposições FIBES, sala 20, com a participação de altos representantes governamentais do Brasil, Espanha e África do Sul, organizações internacionais e especialistas globais. Veja a nota aqui.