A Oxfam Brasil lança nesta segunda-feira, (13 de outubro), o relatório “Encruzilhada Climática – Um Retrato das Desigualdades Brasileiras”, que evidencia as graves lacunas no financiamento da agenda climática no país e como essas falhas aprofundam as desigualdades raciais, de gênero e territoriais.
O documento analisa, além de diversos indicadores sociais e econômicos, políticas nacionais e o orçamento federal entre 2023 e 2025 e conclui que a falta de investimentos em adaptação com olhar antirracista, e gestão ambiental e políticas públicas básicas coloca em risco principalmente as populações historicamente mais vulneráveis.
Financiamento ambiental é minúsculo perto de setores poluentes
Em 2023, a função Gestão Ambiental recebeu apenas 0,34% do total de recursos empenhados no Orçamento da União. Na prática, isso significa que, a cada R$ 300 do orçamento federal, menos de R$ 1 foi destinado diretamente à proteção do meio ambiente. Enquanto isso, setores com alto impacto sobre as emissões de carbono, como Agricultura (R$ 90,25 bilhões) e Transporte (R$ 43,91 bilhões), receberam volumes significativamente maiores.
A disparidade fica ainda mais clara ao comparar o Fundo Clima, que recebeu R$ 10,4 bilhões, com o Plano Safra 2024/2025, que contou com R$ 400 bilhões. “Essa escolha orçamentária revela uma prioridade perversa: privilegia setores que intensificam a crise climática em detrimento da proteção das pessoas e territórios em maior vulnerabilidade”, afirma Viviana Santiago, diretora-executiva da Oxfam Brasil.
Desigualdades raciais, de gênero e territoriais ampliam vulnerabilidade climática
O relatório demonstra que os impactos da crise climática não são iguais para todos. As populações mais afetadas são as que já enfrentam historicamente as piores condições de vida:
- Mulheres negras estão na base da pirâmide social e econômica: recebem em média R$ 1.281, menos da metade do rendimento dos homens brancos (R$ 2.598).
- Regiões Norte e Nordeste concentram os piores indicadores de renda e os maiores percentuais de população preta, parda, indígena e quilombola, justamente as que mais sofrem com secas, enchentes e outros eventos extremos.
- Favelas e periferias, onde 73% da população é negra, estão localizadas em áreas de risco, sem infraestrutura adequada para enfrentar chuvas intensas ou ondas de calor.
“Estamos diante de um racismo ambiental evidente. A crise climática escancara e aprofunda injustiças históricas. Não haverá transição justa sem enfrentar o racismo, a desigualdade de gênero e a concentração de terras”, destaca Viviana.
Lacunas das políticas públicas perpetuam injustiça
O estudo aponta que a abordagem do Estado brasileiro ainda é predominantemente reativa, com a liberação de créditos extraordinários para desastres – como os R$ 111,6 bilhões destinados às enchentes do Rio Grande do Sul em 2024 –, em vez de investimentos preventivos.
Além disso, apenas 12% dos R$ 185 bilhões previstos no Plano Plurianual (PPA) 2024-2027 para ações climáticas são destinados à adaptação, área essencial para proteger comunidades em situação de vulnerabilidade.
Recomendações para uma transição justa e antirracista
Diante desse cenário, a Oxfam Brasil defende:
- Incorporar recortes de raça, gênero e território em todas as políticas climáticas.
- Garantir participação vinculante de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais nas decisões.
- Direcionar recursos para adaptação nos territórios mais vulneráveis.
- Condicionar o crédito rural à adoção de práticas sustentáveis e à redução de emissões.